A "Coisinha"
Em 1982, ano em que me formei em Direito, eu tinha algumas motos desmontadas e uma para "rodar por aí", uma RX 125 que eu comprei de um amigo "rachador", o "Beto Gordo" e que eu "fucei" um pouco mais, cortando o miolo de escape pela metade e deixando a metade dentro solta para acelerar junto com a saída de gases, além de alisar o "torque induction" e depois bater punção para a mistura entrar convulsionada na câmara, além de acertos de giclê, agulha e vela, entre outras...
A maquininha não tinha o velocímetro ligado e eu pilotava pelo conta-giros, tendo noção de velocidade pelo regime de giros e pela marcha engatada...
A coisinha andava à noite sem farol e sem lanterna - se eu não me engano, eu andei com essa coisa de três ou quatro vezes com a parte de farol e lanternas ligados...
Era um dia de semana, à tarde, ensolarado e eu estava "coçando" sozinho, quando resolvi ir ao Parque Continental à casa do meu amigo César, que também era motociclista, mas o "bicho" não estava em casa, não lembro se estava na faculdade ou outra coisa qualquer...
Mas, aí, saiu a irmã dele, a Regina, dizendo que iria até Pinheiros e eu perguntei se ela queria uma carona, respondendo ela que iria bem se eu a deixasse no terminal de ônibus.
Chegando ao terminal, como eu estava na "coçação", perguntei se ela queria uma carona a Pinheiros; ela aceitou e lá fomos...; peguei a Corifeu de Azevedo Marques e fui "tocando"...
Na altura da Vila Indiana, perto do Instituo Butantã, na USP, ela me disse que iria ficar na Avenida Caxingui, pois iria visitar a amiga Alla, com a qual eu namorei em 1976, um namoro extremamente tumultuado pela família dela, mas que me altera o ritmo cardíaco até hoje (...), tanto pelos atritos com a família (principalmente a mãe,Olga) , quanto pelo amor (que eu carrego comigo como uma mala velha até hoje).
Deixei a maquininha na calçada do prédio onde ela morava e entramos, subimos de elevador e lá fomos ao andar do apartamento. A Regina tocou a campainha, embora a amiga estivesse esperando, pois o porteiro havia avisado pelo interfone.
Entramos, primeiro a Regina e eu logo atrás. Ela me olhou surpresa e eu dei um beijo em seu rosto e perguntei-lhe como "iam as coisas". Ela respondeu que "estão indo" e eu aproveitei para olhar a maquininha pela janela, minúscula na calçada vista do alto, quando, de repente, ela me disse que eu tinha que ir embora que eu não poderia ficar e eu respondi que eu aproveitei a carona dada à Regina para convidá-la para a minha formatura, após o que ela entrou em pânico dizendo que eu não podeira ficar ali, que a mãe estava dormindo e começou a me empurrar porta afora.
Quando eu estava no corredor, ela entrou e fechou a porta, mas a Regina, que havia saido comigo, explicou que a Olga, se acordasse e me visse ali, iria fazer um escândalo tremendo. Eu me despedia da Regina, peguei o elevador e desci.
Na rua, eu "puto", liguei a RX e peguei a Vital Brasil, acelerando com raiva, mas parando nos sinais. Aí, fui para a Eusébio Matoso, mais "puto" ainda e subi em direção à Avenida Rebouças.
Eu acredito que deveriam ser "umas três da tarde". Resolvi acelerar mais e entrei na Avenida Faria Lima, com a pedaleira direita quase raspando o asfalto e aí eu acelerei a bichinha para "esgoelar"...
Olhei adiante e vi os semáforos ao longe,mas eu estava tão "puto" que eu resolvi acelerar sem frear para nada e pedia para um carro atravessar a Faria Lima para entrar no Shopping Iguatemi só para sentir a porrada...; mas nada!
Continuei "no pau" , sem noção da velocidade, mas via as coisas passarem em um borrão e logo pensei: vou dar uma porrada sensacional no cruzamento com a Avenida Cidade Jardim.
Quando chequei ao cruzamento, lembro que uns caras parados, de carro, não cruzaram, esperando eu passar e, quando me dei conta, eu já estava na Rua Iguatemi, parando ali perto de um bar, onde entrei para tomar alguma coisa para a "birra" passar...
Ainda voltei para a Faria Lima esperando "pintar um rachinha", mas nada e acabei parando no Largo de Pinheiros e imaginando que somente a possível "porrada" iria me transformar em herói dos sonhos de adolescente...
Mas, quando eu olhei para o tanque da maquininha, eu fiquei com dó, pois outra igual àquela eu não iria achar e muitos "carinhas" estavam precisando tomar um gás nos rachas que eu ainda iria tirar (e tirei)...
A maquininha, num momento de burrice, vendi para um moleque chinês que, quando viu ela andar, só faltou me beijar na boca...
e a garota, nunca mais vi (embora ainda sinta saudades)...
José Wellington Porto
Osasco - SP
wellporto@yahoo.com.br