Um pouco da história da convivência com minha "Clássica do Coração".
DUCATI SCR 250 SCRAMBLER
Marcos V. Pasini
Quando, na metade dos anos 70, antes da importação ser fechada, as DUCATI SCR 250 Scrambler foram importadas, eu estava ainda entrando na faculdade não tendo condições de poder adquirir um modelo, na época, fora da minha realidade econômica.
Aquela Ducati diferente das outras que eu conhecia, chamada Scrambler, um mixto de "street" e "trail" cuja tendência marcou época nos anos 60/70, me chamou muito a atenção, despertando-me o desejo de um dia comprá-la.
Mas o tempo passou, e como foram poucas unidades importadas, raramente eu via algum exemplar daqueles rodando pelas ruas.
Certa ocasião Rubens, um colega de trabalho, querendo comprar uma Suzuki DR650 que eu estava vendendo e, sabendo do meu gosto por Ducati's, pois eu tinha acabado de adquirir uma Cagiva 900 Desmo e estava fazendo o maior alarde sobre o motor que tinha a grife DUCATI, me ofereceu como parte do pagamento uma certa "Ducatinha" de guidão largo, antiga, 250cc bem "surrada", que foi sua moto do dia-a-dia por muito tempo e que estava encostada no fundo da garagem sem funcionar o motor por mais de 2 anos!
Bingo!! Não deu outra, era uma delas!!! Topei na hora sem sequer ver o estado em que se encontrava!
Me lembro de que quando fui, com a minha carreta, pegar a moto na casa dele, sua esposa indignada disse:
-Rubens, você vai ter coragem de vender esta droga para seu amigo?
Ao que ele respondeu, dando de ombros:
-Vou fazer o que? Ele a quer...
Minha esposa, que estava comigo, olhou bem para a moto e disse (provavelmente para me agradar):
-Ela vai ficar linda!!
Bem; aí começou a novela! Isso foi em julho de 1995.
Chegando em casa não resisti:
Montei o Carburador Dell'Orto que o Rubão teve o capricho de guardar seco, separadamente.
Troquei o óleo do motor, coloquei um pouco de gasolina e comecei a tentar virar o motor.
Apesar de 2 anos sem funcionar, o pistão não chegou a "grudar" na camisa e então, após algumas (inúmeras) tentativas, eis que ele respondeu!!! Com o ruído típico do trem de acionamento das válvulas (não é Desmo mas também é ruidoso) após quase 2 anos ele estava de novo funcionando...
Virei criança novamente; quase que imediatamente comecei a desmontar a motocicleta inteira.
Saí em busca de peças de reposição originais. Percorri, em vão, todas as lojas do circuito da Barão de Limeira / Gal. Osório / etc. e comecei a garimpar, em meio a descrença dos lojistas da região...
Consegui todas as lâmpadas 6V em Santiago, no Chile e, na Itália, a bateria, cabos de velocímetro e conta-giros, retentores, pistão e anéis, etc..
A tinta, eu consegui mandar reproduzir idêntica à original.
E assim foi. Toda vez que eu fazia alguma viagem ao exterior, tentava conseguir alguma reposição, mesmo sem precisar.
Hoje eu mantenho um micro-estoque de reposição para ela e, ocasionalmente, consigo garimpar alguma peça "recuperável" em oficinas do interior de S.Paulo e do Rio de Janeiro.
Conseguidas as peças que precisava, parti para o trabalho: pintura, recuperação do escapamento, polimento de cubos de rodas e cromeação dos raios, capeamento do banco, recondicionamento dos amortecedores, etc, etc.
Começamos, minha esposa e eu, a parte artesanal, ou seja, lixar e pintar detalhes, polir metais oxidados, retocar pequenas falhas, e uma série de itens, estendendo-se por alguns fins-de-semana a fio.
Concluída esta parte, rodamos com a moto por um tempo, até que resolvi revisar a parte elétrica e ver como estava o coração da SCR, o monocilíndrico OHC.
Deixei esta parte para meu amigo Gilberto, em Santos, cidade onde moro, que é outro tarado por Ducati e que, em sua oficina (Moto-Hobby), com a ajuda do "Seu" Tico, trocou fios, conectores e fusíveis, abriu o motor, e caprichosamente limpou, retificou o cilindro (tinha oxidado a camisa, pois ficou muito tempo parada), assentou e regulou válvulas, etc, deixando-a nova.
Terminada esta fase, logo no fim de semana seguinte aconteceria o II -Megacycle em Serra Negra, e ela foi para lá. Perfeita!!! Soberana!!!
Posteriormente entrei para sócio no "Veteran Motorcycle Club do Brasil", e passei a ter contacto com outros que, como eu, são aficcionados por motos antigas e pude perceber que as coisas teriam sido mais fáceis se os tivesse consultado naquela época. Mais enfim, valeu assim mesmo.
Ha pouco tempo atráz, fui visitar o Rubão, com a moto.
A esposa dele abriu a porta da casa, que dá para o quintal sem muros em uma vila, e espantada disse:- Não é possível !!! Não posso acreditar que se trata da mesma moto!!!...E ele quase que emocionado disse:
- Como vai a "nossa" Ducati?
Hoje, ela já posou para fotografias em duas das melhores revistas especializadas de motos do Brasil e eu, agora, dou razão à minha esposa quando disse:
- Ela vai ficar linda !
Ela não estava brincando.
Ficou linda mesmo!